O técnico Mazola Júnior é um homem de personalidade forte, que não mede
as palavras na hora de falar. Passou pelo Recife e foi responsável por
oito meses de frases de efeito, provocações e crises quando esteve à
frente do time profissional do Sport. Antes de assumir definitivamente o
Leão, treinava o juvenil rubro-negro, e foi interino quando esperava
mais uma decepção na Série B do Brasileiro. No entanto, aplicou uma
incrível sequência de vitórias nos últimos cinco jogos levando o time
para a Série A, quando todos já davam o acesso como perdido.
Pressionado pelo resultado inusitado, o clube efetivou Mazola para
comandar a equipe no Pernambucano. Inexperiente, ficou incomodado por
críticas da imprensa e resolveu contra-atacar, arrumando intrigas
ferrenhas. Por não ter currículo, teve que engolir o comportamento
intempestivo do meia Marcelinho Paraíba, estrela do time que a cada
semana se envolvia em polêmicas.
Mazola está em Campinas esperando retomar carreira próximo ano (Foto: Lula Moraes / GloboEsporte.com)
Não conseguiu administrar o caldeirão que é o Sport e terminou perdendo
o rumo da equipe, caindo na segunda fase da Copa da Brasil. Perdeu a
final do Pernambucano para o Santa Cruz, a única derrota em clássicos, e
pediu demissão pela situação insustentável que se encontrava. Tentou o
Ipatinga, onde fez péssima campanha na Série B e durando pouco tempo.
Depois disso, conta que recebeu algumas propostas, mas preferiu passar
um tempo se reciclando e espera 2013 para retomar a carreira.
Mazola conversou com o GLOBOESPORTE.COM na cantina que leva o nome do
seu pai, Zuza, em Campinas, e relembrou sua passagem pelo Sport. Mais
comedido e arrependido de alguns atos, preferiu não nominar as pessoas
criticadas por ele, mas como não poderia deixar de ser, é o Mazola de
sempre: soltando a língua, com revelações e frases impactantes. Um
personagem que sai da mesmice futebolística.
PERÍODO SABÁTICO
Fiz uma análise de todo o trabalho que fiz e vou melhor para 2013"
Mazola
Eu achei que era um momento de dar uma respirada, depois de tanta
tensão. Vou dar um tempo até aparecer um projeto que me motive e me
cative. Fiz uma análise de todo o trabalho que fiz e vou melhor para
2013. Depois que pedi demissão no Sport, apesar de publicarem que eu fui
demitido, e da minha passagem pelo Ipatinga, reavaliei a minha relação
com a imprensa e com o mundo futebolístico.
Precisava abrir meu leque em relação a empresários e cartolas, estar no
meio boleiro, o que agora faço. Já na relação com a imprensa, fiz um
mídia training em São Paulo e observo a situação um pouco diferente.
Lógico que não vou mudar o meu jeito, meu caráter, mas muitas coisas
desnecessárias deveriam ter sido evitadas por mim. Agi com a mídia de
forma que não repetirei mais. Serei um Mazola diferente da época do
Sport, do Ipatinga e até do Ituano.
ARREPENDIMENTO
A discussão com a imprensa foi desnecessária e só serviu para me
desgastar. Com o tempo, a minha imagem em relação à torcida foi
prejudicada e esse era um dos elementos que me sustentava no Sport, pois
a moral que tinha com ela em 2011 foi um impulso para a minha
contratação no profissional.
DECEPÇÃO COM A TORCIDA
Mazola revela decepção com a impaciência da
torcida do Sport (Foto: Aldo Carneiro / PE Press)
Uma coisa que me chateou muito e tive que aguentar foi no segundo jogo
da semifinal contra o Náutico. Com 15 minutos de jogo a torcida estava
gritando "burro, burro", com 15 minutos! O técnico alvirrubro Alexandre
Gallo reconheceu que não esperava perder o primeiro embate nos Aflitos e
até hoje ele fala que eu arrebentei com o esquema dele. Só que ninguém
elogiou, não lembraram que há quatro anos o Sport não batia o rival nos
Aflitos e quando chegamos para decidir na Ilha do Retiro, joguei com o
regulamento, no qual poderíamos até perder por um gol.
O time deles estava voando, deram um baile na gente na semana anterior,
perdendo por azar, e eu ia jogar com o Sport aberto? Com todas as
vantagens que tinha? Não tinha que escalar três postes lá na frente, com
Marcelinho Paraíba, Jheimy e Jael, ia apanhar. Aí a torcida me xinga no
início do jogo, não tinha mais condições.
DECEPÇÃO COM A DIREÇÃO
Na semana da final do Pernambucano, contra o Santa Cruz, houve uma
reunião entre o presidente Gustavo Dubeux e os diretores do Sport para
abrir uma votação sobre a minha permanência. Fiquei sabendo disso e na
véspera da final recebi uma ligação de alguém do clube informando que
eles já haviam fechado com outro treinador para assumir a equipe no
Brasileiro. Mesmo depois do Dubeux me ligar, garantindo que não havia
nada disso, aquilo me chateou bastante. Ali eu fiquei inclinado a deixar
o Leão, com ou sem título.
DESORGANIZAÇÃO NO SPORT
Deveria ter mudança de paradigma dentro do clube, que não podem mais
existir e ninguém consegue acabar. O grupo de diretores do Sport é um
problema, uma confusão, porque eram três diretores de futebol (Guilherme
Beltrão, Aloisio Maluf e José Aécio), um gerente de futebol (Cícero
Souza) e o presidente Dubeux para decidirem as coisas em conjunto. Um
opinava A, outro defendia B e como se chegar a um consenso com cinco no
comando. Deveriam delegar mais poder ao gerente ou deixar apenas um
diretor de futebol.
Outra coisa é a quantidade de gente que entra no vestiário antes e
depois dos jogos. Para fazer o quê? Não dá para aceitar que numa
agremiação da magnitude do Sport, tenha essa intromissão no vestiário. E
o pior é que gente da oposição circula por lá, só que os caras torcem
contra na cara de pau e vão ver os jogadores. Estão para secar.
Poxa, aí o clube tem três assessores de imprensa e eles não conseguem
filtrar as informações porque elas vazam a toda hora da Ilha do Retiro.
Sabia o que acontecia no Sport, como se jogava contra. Eu tomava café
com as lavadeiras, andava com os seguranças, motoristas, copeiras,
roupeiros e era dessas pessoas que eu descobria o que acontecia, pois
elas são o Sport Club do Recife. Foi dessas relações que soube, por
exemplo, do forte movimento para que eu não assumisse o time em 2012,
depois de tudo que eu havia feito na Série B do ano passado. Queriam que
eu voltasse a ser auxiliar. Tem muita gente que joga contra ali.
RESPOSTA DA ASSESSORIA DE IMPRENSA DO SPORT
"O
que Mazola está dizendo que vazou não é 75% do que poderia ter vazado.
Mazola tem que levantar a mão para o céu e agradecer a assessoria do
Sport Clube do Recife", disse Álvaro Claudino, assessor de imprensa do
clube.
CONTRATAÇÕES
Não tive as contratações que queria. Havia uma esperança de que a
molecada segurasse a onda, mas infelizmente eles não deram conta do
recado e as contratações se machucaram. Poxa, era para Gilberto, Felipe
Azevedo e Henrique terem chegado no início do ano, comigo, pois pedi o
trio ao clube. Só chegaram após o estadual e custaram muito mais ao
Sport do que na época que pedi. Eram esses caras que eu tinha em mente
para o ataque, não Jael e Jheimy.
JHEIMY E JAEL
Jael deixou o Sport no início da Série A
(Foto: Aldo Carneiro/Pernambuco Press)
Jheimy foi uma aposta, fez uma boa Série B, mas no Atlético-MG não
rendia. Não deu certo no Sport, infelizmente, pois é um cara bacana e
muito esforçado. Já Jael surgiu através de uma proposta financeira
interessante ao clube e errei em achar que poderia reverter a situação
extracampo dele. Foi bom ele ter ido jogar na Coreia do Sul porque ele
estava com um pepino gigante em relação a família em Belo Horizonte.
Estava em crise e por isso não tinha cabeça para jogar,
consequentemente o cara bebia quase todos os dias. Vivia num bar no
bairro de Boa Viagem, durante a semana, emborcando cerveja. No jogo do
"burro, burro" eu o saquei da partida. Sabe por quê? Porque na véspera
ele foi pego 2h, na madrugada, em uma boate. Isso foi de sexta-feira
para sábado e a semifinal foi no domingo.
PARA-RAIO
Com toda a diretoria também sendo responsável pelas ações do clube, só
eu levava porrada. Quando saí, disse a eles "o para-raio saiu". Poxa,
existiam coisas que deveriam ser repartidas, pois não eram
responsabilidades minhas, mas as críticas tinham endereço. Torcida e
imprensa reclamavam das contratações, só que isso era problema de Cícero
Souza. Não soube escolher ou teve dificuldades de trazer jogadores. Não
tenho problemas com ele, tivemos um relacionamento profissional e não
posso me queixar de Cícero, no entanto exemplifico porque só batiam em
mim, quando havia outros alvos.
RECONHECIMENTO TARDIO
Quando fui para Ipatinga, o pessoal do Sport ligou torcendo por mim,
desejando boa sorte. Acho que deixei boa impressão e hoje tenho certeza
que a diretoria do Sport reconhece o meu trabalho muito mais do que
quando eu estava por lá. Muita gente me ligou para elogiar
principalmente a metodologia de campo. O extracampo com a imprensa, isso
foi aprendizado e a vida é assim, mostrando que tenho que mudar nisso.
Tenho certeza que tenho portas abertas na ilha do Retiro.
IMPRENSA
Aprendi que se eu tiver uma conversa com pessoas como os comentaristas
Lúcio Surubim, Léo Medrado e Roberto Nascimento, eles vão me compreender
e talvez possam mudar de opinião sobre mim. Essas pessoas me
prejudicaram, mancharam a minha reputação com a torcida, me derrubaram
por perseguição. Pelo aproveitamento eu tinha, não era possível ter o
nível de contestação deles.
FALASTRÃO
Não acredito que tenha faltado cabeça. Quando existe a ingratidão, a
incoerência, sobre a pessoa, isso pesa demais. Eu não sou daquele jeito.
Fui injustiçado muitas vezes e Guilherme Beltrão, um cara sensacional,
me ligava de madrugada para me orientar por contar as minhas
declarações. Ele é até chato neste quesito, mas reconheço a importância
daqueles telefonemas e reconheço que exagerei nesse sentido.
MARCELINHO PARAÍBA
Marcelinho Paraíba trocou o Sport pelo Barueri
(Foto: Divulgação/Sport)
Não tenho nada a reclamar de Marcelinho Paraíba, com exceção do
primeiro jogo da final do Pernambucano, contra o Santa Cruz (o jogador
deu um esporro em Mazola diante de todo o estádio porque foi
substituído). Pelo que ele fez na Série B e no Pernambucano, tinha o
direito de jogar a última partida, não tinha como tirá-lo do time.
Sei que a negociação com o Barueri o atrapalhou nas finais e Marcelinho
estava sem cabeça para atuar. Percebi depois, mas nunca me deu
trabalho.
SPORT NO BRASILEIRO
O Sport deixou para montar o time do Brasileiro na porta do campeonato,
por isso demorou demais para encaixar. A equipe está tendo um bom
segundo turno, o clube está pagando o preço pelo primeiro turno,
consequência da lentidão para armar o grupo. Torço muito para que o
Sport não caia por conta de Gustavo Dubeux, que passou por tudo que eu
sofri na Ilha do Retiro. É o melhor presidente para alguém que esteja
nesse ramo porque não deixa faltar nada em estrutura, os caras pedem e
ele banca, paga o que for para trazer jogadores. Assisto aos confrontos e
fico nervoso, pois estou torcendo por Dubeux. O problema volta aos
paradigmas do Sport, que precisa mudar e estrutura política.
OUTROS TREINADORES
Depois de mim, vieram Vágner Mancini, Waldemar Lemos e agora Sérgio
Guedes. São três treinadores na mesma competição, o que comprova o que
eu questionava direto. Será que o problema do Sport é o técnico? Tudo
que eu falei no primeiro semestre está aí, no nacional. Quando fomos
desclassificados na Copa do Brasil para o Paysandu, avisei que
precisaríamos de reforços de peso para o Brasileiro, só vieram em cima
da hora. A imprensa não aceitou a novidade que era Mazola Júnior,
criticavam tudo, até a escalação do volante Rivaldo na lateral, quando
ele já tinha 45 partidas na posição quando atuava com Luiz Felipe
Scolari no Palmeiras. Todos os pecados eram de Mazola, mas me diz,
Mancini ficou? Waldemar ficou?
NÃO DUVIDEM DO SPORT
Ano passado ninguém acreditava que o Sport iria subir para a Série A,
assim como ninguém acredita permanecerá na elite. O time não cai, até
porque esquecem que o Sport é Jason.
Por Lula Moraes
Campinas, SP - GLOBOESPORTE.COM
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